segunda-feira, 23 de novembro de 2015

bienal de design - para quem?

modelagem 3d do catálogo da bienal por dougrodrigues.com.br

para o catálogo da bienal brasileira de design 2015 - florianópolis, escrevi um texto de apresentação, compartilhado logo abaixo. 
o catálogo, com projeto gráfico da eg design, pode ser visto integralmente em edição online.


bienal de design - para quem?

a bienal brasileira de design é hoje o maior evento de design efetivamente nacional voltado de maneira ampla para a produção dos diversos setores da nossa indústria, comércio e serviços, exibindo o alto grau de qualidade, inovação e competitividade do nosso design. consequentemente está imbuída de um significado extremamente relevante para a nossa indústria e para nossos profissionais de design – que desempenham hoje um papel que é cada vez mais estratégico e integrado aos estágios iniciais e decisórios na cadeia de desenvolvimento de produtos, de serviços e até mesmo de novos negócios e de políticas públicas. a bienal traz portanto um caráter intrinsicamente estratégico em si própria, pela sua magnitude, representatividade, e pelo registro que faz tanto para a história como para servir de benchmark para o mercado, além de plataforma de experimentação, discussão e lançamento de novas ideias e novos produtos.

ao ser atribuído à esta edição da bienal brasileira de design o tema “design para todos”, procurou-se enfatizar uma série de princípios sobre os quais se assenta o bom design. não se estava portanto falando de design de uma maneira mais ampla, mas sim fazendo um recorte bastante específico. fala-se daquele design que inclui, que amplia o alcance, que estabelece conexões, que integra, que proporciona oportunidades igualitárias, que considera todo o amplo espectro de usuários - “e não apenas personas”, nas palavras de dan formosa (um dos participantes do seminário internacional). neste universo deve-se considerar (e incluir) ainda o design com todos, aonde o usuário assume o papel de co-participante do processo de criação de novos produtos e serviços e da atribuição de valores à estes. isto não faz com que todos sejam designers - o mundo seria insuportável se este fosse o caso - mas distribui entre todos, de forma igualitária, democrática e cidadã a responsabilidade de construir o nosso futuro através dos objetos, produtos, serviços, que consumimos e utilizamos. faz com que todos sejam chamados a pensar sobre o uso racional de recursos, de energia, sobre a vida útil dos produtos, sobre o valor econômico da produção, sobre valores culturais, sobre convivência entre diferentes.

mas há outras dimensões que devem ser consideradas também dentro deste tema, e que perpassam a própria ideia de uma grande exposição representando o design nacional. como bem chamou atenção ralph wiegmann, outro dos convidados internacionais durante o seminário de abertura: design para todos, antes de mais nada, não é design para designers apenas. sabemos que um seminário internacional sobre design vai atrair principalmente um público de designers - profissionais, pesquisadores e estudantes da área - pois estes são os principais interessados em debater e fazer avançar a sua área de atuação. no entanto, é necessário que se deem passos cada vez mais efetivos para haver um melhor entendimento sobre o potencial que a disciplina do design traz para a indústria, para o comércio, para os serviços, e para o governo - e obviamente, até por extensão, à toda a sociedade. existe portanto a necessidade de estender o alcance para que mais empresários, mais governantes, mais legisladores, mais membros do poder executivo, mais estudantes de todos os níveis e de todas as áreas, mais donas de casa, mais funcionários públicos, mais operários, mais trabalhadores de todas as áreas, se interessem em saber o que é design - e que benefícios pode trazer para todos.

no atual cenário político e econômico, em que caberia investir em design, inovação e aumento da competitividade, o que se tem visto na área do design é uma redução constante do apoio governamental. o papel estratégico desempenhado pelo design hoje na europa, e incentivado através de programas originados nos organismos de gestão da ce e replicados pelos seus países-membros, tem sido frequentemente desconsiderado nas esferas públicas no brasil. até mesmo programas que alcançaram relativo sucesso foram recentemente desmobilizados ou desestruturados, e sente-se a falta de um instrumento eficaz de gestão das políticas nacionais de design, como de resto existe em diversos países aonde o design é considerado uma ferramenta estratégica imprescindível – reino unido, finlândia, coréia do sul, taiwan, para citar apenas alguns.

pudemos observar a mobilização e o entusiasmo com que a federação das indústrias de santa catarina abraçou o evento para torná-lo viável, junto com outros importantes parceiros do governo estadual e federal. no entanto não posso me esquecer da experiência vivida há quase vinte anos num congresso do icsid no canadá, quando a coréia do sul disputava o privilégio de sediar congresso semelhante em seul. para defender a candidatura, além do apoio (e investimento) massivo da indústria coreana, a delegação trazia dois ministros de estado. havia ali uma clara intenção política de fazer uso do design como uma ferramenta para alavancar a indústria coreana a novos patamares de inovação e competitividade, cujos resultados todos conhecemos hoje. é muito importante enfatizar este episódio: não eram funcionários graduados que haviam se deslocado de seu país para representar o governo – mas sim dois representantes do primeiro escalão do governo coreano, numa clara afirmação da importância que o presidente e seus ministros atribuíam ao design. este endosso oficial ao evento internacional fazia parte de um plano maior que tinha como objetivo alavancar economicamente o país – objetivo este plenamente alcançado. precisamos atingir no brasil este grau de entendimento e comprometimento por parte de nossos governantes. já presenciei e li declarações vindas de políticos do primeiro escalão executivo – em instâncias federais, estaduais e municipais – que comprovam existir sensibilidade ao assunto, mas ainda precisamos de maior comprometimento, de mais espaço nas agendas. cabe a nós designers – e aos empresários e políticos engajados e comprometidos com esta agenda – a responsabilidade de levar às diversas instâncias de governo o conhecimento sobre o papel estratégico do design, através de ações focadas nestes segmentos. um maior número de empresários também precisa ser atingido e sensibilizado. existem diversas possibilidades a explorar – muitas delas a partir do próprio projeto da bienal.

o brasil tem recebido uma tal quantidade de prêmios internacionais de design que isso fez com que o design council britânico apontasse em 2008 o nosso design como “serial award-winner” – um enorme elogio dentro de um relatório que apontava novas tendências internacionais que deveriam ser observadas. de lá para cá só fizemos aumentar o número de prêmios conquistados – a consequência lógica seria portanto explorar isso levando nossos produtos para serem expostos e consumidos em outros mercados. sinal de maturidade do nosso design e da nossa indústria, essa exposição a um mercado internacional extremamente competitivo produz reconhecidamente uma espiral ascendente de qualidade, posicionando nossos produtos favoravelmente no mercado internacional. a bienal brasileira de design traz nesse aspecto uma grande oportunidade: da mesma forma que temos recebido representações de países convidados (este ano, a holanda), deveria se aproveitar o enorme e custoso esforço de levantamento e fichamento da produção nacional e levar ao menos parte da mostra principal para um itinerário de divulgação no brasil e no exterior. sua itinerância no país serviria para potencializar e amplificar seus objetivos de levar à sociedade o entendimento do que é design e mostrar a significante produção do país. leva-la ao exterior, em feiras, mostras e museus, serviria para a prospecção de novos mercados, demonstrando a maturidade de nossas empresas e do nosso design.
pensando localmente, os quase 150 eventos paralelos que invadiram a cidade somados aos sete eventos principais da bienal brasileira de design certamente deixarão um legado importante para florianópolis: um melhor entendimento da população, de empresários e da esfera pública sobre o que é design e qual o potencial que ele tem de transformar realidades. uma compreensão de que o design vai muito além do seu aspecto estético. que design não é um componente apenas de produtos de luxo. que design não é custo, mas investimento – e que traz um retorno bastante significativo, como diversos estudos nacionais e internacionais comprovaram nos últimos anos.

esta bienal é portanto para todos – e não apenas de e para designers – mas tem ainda o importante papel de apontar caminhos para o governo, para os empresários, e para a sociedade. para que estes possam reconhecer e acreditar no poder de transformação e de promoção de crescimento econômico, industrial, e social que o design traz em sua capacidade agregadora e transdisciplinar. precisamos assegurar que se enxergue no design não apenas o seu aspecto estético, mas principalmente o seu potencial inovador e estratégico. um bem conduzido processo de design que racionaliza produção e uso de materiais, alcança mais fácil e efetivamente o mercado por reconhecer empaticamente o usuário, reduz riscos ao assimilar internamente a experimentação como método de projeto. bom design para o empresário e para o usuário, para o meio ambiente e para o desenvolvimento da sociedade. bom design para todos!


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